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terça-feira, 4 de outubro de 2011

A Primeira

Serviu-me picanha maturada, com fritas, cebola e pimentão, em chapa de ferro
Antes obrigou que eu passasse pela ponte
Percorresse estradas de terra
Desviasse de cavalos
Neblina
Mas por ser a primeira
Me propus a tudo isso
A cheirar tinta fresca
Não ver os pêlos primievos de teu sexo
Não sentir o gosto de teus beijos
Passar rapidamente pela matriz e não tirar fotos
Abrir a janela de meu quarto e ver duas chamas incandescentes
Por uma mísera hora não chegar
O portão estava fechado
Meu lindo coração cerrado, minhas orelhas com brincos de prata de Potosí também
Tudo fechado
Você não me deu uma filha
Por enquanto
Me mantenho calmo
Te espero em Cumbica, sem casaco de plumas, sem camisa-de-força
Mas com os olhos tão marejados de tua chegada
Estou todo derretido
Meus óculos, por exemplo, se dissolveram no saguão do aeroporto
Escuro
Escuro
(Pela janela do quarto ardem duas flâmulas incandescentes)
Em Barão de Cocais há o ramal de todos os quartos
Como se você estivesse aqui para eu discar o quarto 216
Ramal 232
O fio, uma ponte frágil
Seria tua alma Apache?
A andar com lobos de patas brancas, pinus e café trazido por americanos, moído em pilões irlandeses
Não fumas tabaco, mas observas eu fumar tão suave após
A caça aos búfalos deixou marcas profundas em meu espírito
E por ser a primeira a me proporcionar o prazer de provar teu néctar suave de mel
Não me esquecerei
Do calor de teus braços quentes
Do amor que não tive e nunca terei
Do barão a quebrar côcôs, colares, tacapes, penas imaculadas vermelhas  
Sinos
Flechas no peito dos búfalos
Sangue
Julieta
Veneno
Extraio, brilho como diamante
As guelras buscam oxigênio
(Da janela, de onde não posso ver mas sei, queimam duas flâmulas)
Minhas patas de centauro soltam fogo ao longo da estrada nebulosa
Beijo tua boca
Tua boca beija a minha
No aeroporto de Cumbica
Pousam pássaros em chamas vermelhas
Em Barão de Cocais passo por pontes
Não tão longe sei que o Guará lá está
Em seu amarelo ouro real
Chove e há previsão de chuva
Mais
Mais
Na pradaria teces sapatos quentes, a neve logo virá dançar
Se abastecer de lúpulo, líquens ombrófilos, fumo
Após
A ponte de diamantes cintilantes
Enxergo a plataforma de desembarque
O beijo
Teus pêlos indígenas, teu fogo, o lobo e o que mais houver  
A pradaria, as flâmulas, o flerte, a plataforma com óculos-escuros derretidos
A camisa-de-força desvencilhada, a pena do tiê, o ouro do Guará
A pata branca do lobo da pradaria, o castor, a neve, o portão fechado, a picanha maturada
A ponte
O beijo
O combustível que não tenho mais
O que morreu em mim e o que nunca hei de esquecer, como a primeira vez que estive na praça da cidade próxima, sem nome
Sem saber como cheguei
Como teu quarto
Teu lábio
A palha dourada
Abocanho o sino, o pêlo, te preencho do amor mais puro e radiante
Como prata de Potosí
Patas alvas
Flechas secas
Profundas
Ramal como
Acelerador
Mariana
(Se não houvesse encontrado esta cama estaria lá)
Na estrada há flâmulas, palitos de fósforos, cabeças de peixes bem fervidas
Busco pegadas de tuas patas, o cheiro do café moído pelo Irmão Lourenço
O anzol na boca do lobo, a carne na bandeja, o amarelo ouro, o diamante que tanto quer fotos
Não veio
Te vi e peguei pela mão
Fomos à floresta procurar o imensurável e a pena do tiê
Em delírio você me aqueceu com a pele de raposa
Eu deitado sobre os pêlos da pele do búfalo que abati, a carne comi com ânsia
Uma fome voraz
Agora, com febre e tremedeira, mesmo com tanto calor
Me imagino só em Barão de Cocais
Esperando em Cumbica e ninguém desembarca
Na floresta, nenhum pássaro voa, ando, ando, não acho plumas
Meu corpo desnudo, sem qualquer casaco de penas vermelhas
O sol queimando a retina, no sunglasses
Não Johnny, não há camisa-de-força, não há flâmulas cintilantes na janela do quarto
Não há lobos, patas brancas, orelhas antenadas, amarelo-ouro
Não há diamantes Johnny!
Não há fotos, búfalos, flechas
Não há
Não há beijo no desembarque
Não há desembarque
Diamante
A trigésima primeira.

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