Seguidores

domingo, 14 de junho de 2009

Saudades - Tela de Almeida Júnior - Pinacoteca do Estado de São Paulo


Original I

Dois copos e um cinzeiro, por favor!
Para ali, perto do mar
Acender um cigarro
Deitado com as costas na neve intensa
A cair, enquanto observo extasiado as estrelas do céu
Na escuridão que só a floresta possui
Por onde passaram os exércitos do Império
E aqueles que puseram fim ao Império
Tal qual a manada de javalis selvagens
Pisoteando meu peito que expira a fumaça outrora azulada
Grunhindo seus guinchos altos
Não tenebrosos
Afinal a noite cai
E meus ouvidos são só filosofia
(Você via mais uma, por favor?)
Já a visão, procura os trópicos
Como se a bota pudesse chutar corpo, neve, javalis a grunhir
Uma pilha de capachos e tapetes amontoados na praça
Não ganhei amor mesmo...
Cais com impacto estrondoso na Terra do Pau em Brasa
Local em que o Cordeiro tem predileção
Pela nova era de caridade e respeito inaugurada a cento e cinqüenta anos
Cai teu corpo gelado, resquícios de neve
Os javalis vagam o mundo em cima dos tapetes e capachos
Agora, por exemplo, estão em Gaza
Desviando de estilhaços flamejantes
Rima?
A indiferença com toda a atenção
Quando derramas sob meus cachos teus sonhos e visões
Teus medos e desejos
Não se esvaem
Recordo e faço arte com teus absurdos não tão absurdos assim
Sem intenção de ferir ou arranhar a pele
Tão somente sorver
Fazer cair
(Neve)
Alva qual o mármore carrara do templo do Império
Amplo
Bem em frente, há dois mil anos aproximadamente
Se despia, longe da orgia dos outros cômodos
Uma mulher de cabelos castanhos claros
Grande estatura
Mamilos dourados e boca de fogo
A sussurrar chamamentos irrenunciáveis e irresistíveis
Vivos até hoje na alma
Broca perturbadora dos sonhos que caminho
Trocaria tudo isso por um pedaço de pão
No estômago pequeno
Um gole de cerveja e um trago de tabaco
Para esquecer da esperança
Da floresta que queimou
Do filhote de basset atropelado
Dos maus-tratos ao bêbê foca
Da Terra Sem Males
Imensa
Árvore que tomba
Cai
Forte como um chute da bota invisível
Até o limite da Serra que se ergue abrupta
Na Mata do Atlântico e só dele
(De ninguém mais, por mais que te puxem)
E se despedes com abraços
E lágrimas nos cantos dos olhos
Vivos
Melhor falar
Falar...
Filosofias de bar
Atravessando o significado das musas do Império
Seus seios rijos
Sua carruagem branca com seus cavalos de fogo
Impulsionando corpo, neve e sorriso
Cabelo ao vento
Até amanhã!
Bom final-de-semana!
Feliz Natal!
Um Ano-Novo repleto de sucessos e alegrias!
Ligam da Embaixada, falam Latim, informações de aproximadamente dois mil anos
E tudo o que queres é o conforto da carruagem amarela
Puxada por cavalos invisíveis, tantos que não sabes quantos são
Lá de cima, o Mestre se regozija com a beleza do amarelo
A percorrer curvas de intenso verde
Até o limite da Serra
Da velocidade de oitenta quilômetros por hora
O Ribeirão Vermelho completa a aquarela
E achas tudo engraçado
Mesmo com teu jeito bravo
Teus ares de revolta
Estás em casa
Tua casa.

Original IV

Das origens e das entranhas o xamã brota
Como se do céu caíssem poesias, palavras
O ácido que tomas hoje foi preparado em tubos de vidro
O tabaco devastou matas virgens nativas
E fumas, ávida
E o xamã traz visões intangíveis
A morte dessecando corpos, guerra
Danças em círculos de fogo
E...
Escolheste beber cerveja preta
Falta de rima
Caos
Inverno
Acenda outra fogueira
Dance nua ao redor, em transe
Faça apresentações ritmadas
Cante e conquiste tudo e a todos
A cobra de 11 quilômetros, com suas escamas frias, te guiará até o Paraíso
O mesmo que ela, que era o amor, fez questão de vomitar
Nem fez tanta questão assim
Nem fez tanta questão assim
Não perguntou
Urrou, bradando seu grito de raiva, sua menstruação doce
Falou impropérios que me fizeram ir embora
Bater com força a porta, para talvez nunca mais voltar
A teus cabelos negros
Presto devoção
Roma jaz sepultada, assim como os anelos e cachos sem igual
Os seios rijos
O mármore carrara
As colunas
Desmoronaram
A barba cresceu
Fiquei sem ácido
Sem amor
Vaguei montanhas frias e escuras pelas madrugadas
De manhã, vi emas, ninguém acreditou
Fumei pontas enquanto dormias com teus lábios grossos e cansados em quartzito
Raspei a piteira
Não fez sentido, dormias tão encantadora
Após a noite sem lua
Sem javalis
Sem neve
Falei em amizade e você corretamente negou
Um passeio, um cigarro, um presente e tudo acabou
Foi bom, não?
Mandarei uma carta, apenas não sei se o endereço que vives é o mesmo
Alguma coisa ficou, eu e esta idéia de amizade, de fugir para curtir
O que você quer agora?
Quer sentir o vento, escalar madrugadas?
Me quer ai, neste lugar de trânsito incessante, de loucos?
Ninguém me descobre, nem eu
A não ser quando viro para o outro lado da cama e te puxo o cobertor
Quando tomo teu ácido e saio nu, procurando fogueiras de São João
Para dançar em volta
Depois pego a direção de tua casa e peço suplicante abrigo
Negas e chove
Rodo por veredas
Bebo chuva pura
Sulfurosa
Corroendo o espírito
Há o Cristo, que me envolve em seu manto cristalino e me guia até uma choupana qualquer
O que fiz?